Publicações - OS CONSUMIDORES SUPERENDIVIDADOS

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OS CONSUMIDORES SUPERENDIVIDADOS
As instituições financeiras e de comércio procuram incessantemente clientes oferecendo cartões de crédito, cheque especial, empréstimos de todos os tipos e compras no carnê. Há uma oferta exagerada de crédito e, para quem adere, passa a ter um superendividamento.
 
Segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo(CNC), 12 milhões de famílias brasileiras estão endividadas, sendo que 85% responsabilizam os cartões de crédito. Do total, 25,6% afirmam que têm contas em atraso e 10,1% disseram que não terão condições de pagar as suas dívidas futuras.
 
Os economistas atribuem o endividamento aos efeitos da democratização do acesso ao crédito, com o incentivo ao consumismo, muitas vezes com compras por impulso e objetos supérfluos ou que não se necessitava naquele momento. Este consumidor, tomado pelo fervor do “dinheiro fácil”, esquece que não existe operação de crédito sem custo: juros, correção monetária e tributos, além de outras obrigações.
 
O Banco Central divulga as taxas de juros das instituições financeiras no país. Para se ter uma ideia de quanto o cartão de crédito é muitas vezes nocivo a economia familiar, tomemos como exemplo o Banco Pan, um dos que oferece maciçamente esta modalidade, além de empréstimos consignados. No período de 13 à 17 de dezembro 2021, na modalidade “cartão de crédito – rotativo em atraso”, a taxa mensal era de 21,11%, ensejando um incremento anual de 895,53%. Já para “cartão de crédito parcelado”, o Banco BMG é insuperável: taxa mensal de 19,46% e anual de 744,28%. Enquanto isto, em seu “Relatório de Inflação”(vol. 23, dez/2021, pág. 62), o Banco do Central do Brasil projeta um IPCA – Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – anual de 2021 em 10,74%.
 
No Brasil não existe uma norma jurídica específica para combater o superendividamento, mas um capítulo dentro do Código de Defesa do Consumidor(CDC), atualizado pela Lei No 14.181/21, que, mesmo não se tratando de solução definitiva, traz um alento para os devedores e freio nas instituições financeiras e a massificação de atrativas ofertas de crédito, onde, em Ato da União Europeia,  se denominou de “assédio de consumo”.
 
O §1o do art. 54-A conceitua o superendividamento como “a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial”. O parágrafo seguinte especifica que estarão inclusos “quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada”.
 
Adiante, a ressalva importante da legislação para os oportunistas e caloteiros contumazes: “não se aplica ao consumidor cujas dívidas tenham sido contraídas mediante fraude ou má-fé, sejam oriundas de contratos celebrados dolosamente com o propósito de não realizar o pagamento ou decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor. ” Como evidente, para se obter estes benefícios é necessária a boa-fé contratual e que o devedor tenha sido atingido por algum “acidente da vida”, como, entre outros, doença, demissão, flagelo causado por fenômeno da natureza ou terceiros ou, como mais recentemente, pela pandemia.
 
Como dito anteriormente, o consumidor deve está sempre de boa-fé e ela fica caracterizada no instante que ele pretende pagar o seu débito. Para tanto, pode requerer instauração de “processo de repactuação de dívidas”, onde, em audiência de conciliação, com a presença dos credores interessados, apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de cinco anos, além das garantias e as formas de pagamento.
 
A legislação adverte para o fato de que na proposta de pagamento, seja garantido ao consumidor superendividado o “mínimo existencial”. Como é comum no direito brasileiro, este termo peca pelo subjetivismo e falta de parâmetro. Entretanto, a experiência cotidiana dos tribunais vem assegurando, pelo menos, aluguel, contas de consumo(água, luz, telefone), transporte, alimentação e educação própria e dos filhos.
 
Na hipótese de todos ou somente alguns credores aceitar a proposta, obrigatoriamente(art. 104-A, §1o), deverá constar da sentença “as medidas de dilação dos prazos de pagamento e de redução dos encargos da dívida ou da remuneração do fornecedor, entre outras destinadas a facilitar o pagamento da dívida”; referência à suspensão ou à extinção das ações judiciais em curso; data a partir da qual será providenciada a exclusão do consumidor de bancos de dados e de cadastros de inadimplentes” e, finalmente e muito importante, “condicionamento de seus efeitos à abstenção, pelo consumidor, de condutas que importem no agravamento de sua situação de superendividamento. Ou seja, não é porque acertou com os credores e o nome “está limpo” que ele pode voltar a contrair novas dívidas.
 
No Brasil não existe a figura da falência de pessoa física. O Código Civil prevê a declaração de insolvência civil, “toda vez que as dívidas excedam à importância dos bens do devedor.” Contudo, acertadamente, o pedido do consumidor de “processo de repactuação de dívidas”, não pode ser reconhecido como declaração de insolvência civil e suas implicações na vida de quem é atingido.
 
O superendividamento dos consumidores é uma realidade, muitas vezes não por inconsequência, mas pelo “assédio de consumo” e ofertas que escondem a realidade das taxas de juros e os pagamentos, como os nefastos “empréstimos consignados em cartão de crédito”, cuja a nomenclatura já começa enganando o consumidor, pois não se trata de “empréstimo consignado”, mas,  uma armadilha para trancafiar a quem dele se utiliza, considerando que não existe a previsão de finalização do pagamento e os juros são extorsivos.
 
O pior é que quem mais se utiliza desta modalidade de crédito são os idosos aposentados ou segurados pelo INSS. Estas pessoas são consideradas vulneráveis pela legislação, porém, mesmo assim, continuam sendo assediadas e ludibriadas diariamente.
 
O Desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco(TJPE), Des. Márcio Aguiar, em primoroso voto em recurso que se discutia “empréstimos consignados em cartão de crédito”, consignou: A amortização pelo mínimo da fatura levará a uma dívida de impossível quitação para o consumidor que recorre a esse tipo de empréstimo. Restando configurado, assim, uma postura contratual perversa, iniqua, adedremente concebida para manter o consumidor indefinidamente em mora.
 
O superendividamento é uma realidade e cabe ao consumidor o comedimento nas compras e contratação de empréstimos ou crédito e aos órgãos de controle e defesa do consumidor extirpar abusividades e modalidades de concessão de crédito que ludibriam quem a elas recorrem.
 
Aos consumidores superendividados, cabe buscar assistência jurídica experiente para solucionar sua situação, impetrando as medidas administrativas e judiciais cabíveis e efetivas.

Autor: Ilton Lima
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1 https://www.bcb.gov.br/estatisticas/reporttxjuros?parametros=tipopessoa:1;modalidade:203;encargo:101
2 https://www.bcb.gov.br/estatisticas/reporttxjuros/?parametros=tipopessoa:1;modalidade:215;encargo:101
3 Apelação Cível 482374-5 - 0002631-04.2015.8.17.0660, Rel. Márcio Fernando de Aguiar Silva, 6ª Câmara Cível, julgado em 27/07/2021, DJe 03/08/2021.


 

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